A Partida

O apito do juiz anunciava a todos que o jogo estava começando. Apesar de estar valendo para a final do campeonato, não eram todos os jogadores daquele time que sentiam a pressão da torcida. Sim, aquele time era diferente. Já haviam jogado juntos por muitos anos e, por mais que a partida valesse título, eles conheciam as habilidades individuais com tamanha precisão que predominava a confiança ao invés da cobrança. Entretanto, o jogo estava duro. Do outro lado havia um time forte, cheio de gana e com muito talento nas cobranças de falta e nas bolas paradas. Depois de um primeiro tempo empatado, mais uma vez o árbitro apitava para o centro de campo e todos os jogadores foram para o vestiário. Era interessante notar a forma como cada player sentia a disputa. Uns estavam com os nervos a flôr da pele; reclamavam das decisões da defesa, criticavam o meio-de-campo e culpavam insistentemente a carência de criatividade no ataque. Outros, mais serenos e discretos, nada diziam; mas dentro de si sentiam uma dor incontrolável que, de fato, os fazia errar os passes mais básicos do futebol. Tinha também jogadores que não estavam nem pra lá, nem pra cá. Mantinham o sangue frio, só esperando o segundo tempo começar para tentar aproveitar uma chance de gol. Enfim, no meio de tudo isso, o técnico mandava as diretrizes, acreditando que todos o ouviam com atenção plena. Quem entrasse no ambiente, entretanto, não teria a noção clara de todas as energias que ali rolavam. Vozes altas e gestos rápidos e brutos davam um tom confuso a toda cena. Porém, atordoante foi o que aconteceu na sequência e que aqui estou para contar. De repente, na porta lateral entrou um garotinho de uns 7 anos de idade. Ele estava vestido dos pés à cabeça com as cores do time. Na mão tinha uma pequena bandeira, daquelas de pregar no vidro do carro. Seu cabelo saia para fora do boné com o brasão da equipe, gigantemente preso pelas travas atrás da cabeça. Nos pezinhos, um par de chuteiras coloridas davam um ar de modernidade. E os joelhos curtos diziam que aquele era, talvez, o mais novo fã daqueles marmanjos sedentos pela vitória. Sua entrada triunfal se resumiu a dizer apenas uma frase, virar as costas e sair como quem não quer nada, deixando no ambiente um clima de estranhamento misturado com felicidade. Era inexplicável. Foi inexplicável. E sempre será. Bom, o time voltou a campo. O jogo continuou duro. Houveram jogadas agressivas, palavras mais ainda, nervosismo e adrenalina comuns a qualquer batalha em um gramado verde, dessas que são provenientes dos campos de guerra medievais. Houve explosão de felicidade dos dois lados, sofrimento em ambas as partes, choro e esperança triturados no mesmo liquidificador de sentimentos que é uma final de futebol. No final, o time do pequeno torcedor acabou ganhando. Foi nos minutos finais, com uma jogada que não dá nem pra explicar em letras e símbolos. Uma espécie de gol de gênio, que recebe dos céus o empurrão certo no momento ideal. E tal feito, perfeito, fez a galera explodir; gritanto para o alto, agradecendo a Deus por poder ver, com os próprios olhos, a magia de um homem escolhido para levar ao mundo uma obra de arte. Ao som do encerramento, toda mídia invadiu o espaço, agora minúsculo, procurando o craque imortalizado com uma pergunta simpless: “A quem você dedica esse gol, que muda a sua vida pra sempre?”. Sem pensar, o gladiador respondeu, felizmente abalado… “Ao garoto, ao garotinho…”. Ah, sim… esqueci de dizer justamente isso, qual foi a frase do pequeno torcedor? Bom… ele entrou e puramente disse: “Eu amo vocês!

©Aos amigos que partiram. Aos que jogam. Aos que brilham. E aos que, só observando, acreditam no poder do amor. Que todos os seres possam se beneficiar.

4 thoughts on “A Partida

  1. Primeiro, é notável como esta estória poderia servir para descrever o que aconteceu com o Ronaldo, na final do campeonato Pualista deste ano – seu timing está perfeito, Ricardo! E acredito que não é o acaso trabalhando. A diferença é que ele não dedicaria o gol ao garotinho… preferiu falar em ser rei por um dia.
    Eu estou no calor da partida, e vencendo ou perdendo, digo que um bom time + amor (que seja da torcida, de nossos familiares e amigos) é o que faz a diferença. Bom time se faz com boas peças, cooperativas, sensíveis e funcionais, que trabalham pelo sucesso coletivo. Amor… quem sou eu pra falar de amor… só sei que deve estar presente pra melhorar tudo e qulque coisa.
    Suas palavras ajudam a nos tornar boas peças e a conhecer um pouco mais sobre o amor.
    Obrigado!

  2. É mesmo, Jaime! Não tinha pensado nisso. =) Ele disso isso porque o “Rei” estava assistindo, e o Ronaldo continua sendo o moleque de outros tempos, dentro e fora do campo. No fundo, não importa muito que faz o gol, nem se ganhamos ou perdermos, pois haverá momentos que vamos ganhar e outros não. O que importa é saber porque se joga! Bem-vindo, Amigão.

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